quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Reportagem

Religiões de matriz africana criam formas de preservação o meio ambiente ecológico


Por Elismar Pinto e Vilma Neres


Sentada em uma das cadeiras de madeira que cerca a mesa presente na sala receptiva do Terreiro Ilê Axé Oiá, mãe Santinha já aguardava para a entrevista que começaria às 14hs. Perguntei para dona Anízia Rocha da Silva, 81 anos, se poderia iniciar a entrevista ligando o gravador de áudio, ela, mãe Santinha respondeu com sinceridade que não seria possível gravar a sua fala. Porque ao longo da conversa pudessem surgir citações que não dizem respeito aos não adeptos do Candomblé.


“O Candomblé se serve da natureza e as plantas são elementos da natureza utilizados dentro do Candomblé. Portanto, sem a natureza não existe Candomblé”, salientou mãe Santinha. O uso das plantas é hoje manipulado pelas yalorixás dentro dos terreiros de Candomblé. Estas adquiriram esse conhecimento através de seus ancestrais africanos e indígenas. As yalorixás guardam consigo a sabedoria e o manejo das plantas, folhas, raízes, frutos e das árvores para fins medicinais e espirituais. “As folhas são elementos formidáveis dentro do Candomblé. Além de sua utilidade para a saúde espiritual às utilizamos para a cura de doenças física”, disse mãe Santinha.

O amor à natureza e o desejo de que ela seja preservada ou utilizada racionalmente pelas pessoas, podem ser constatados nas primeiras escrituras sagradas. Quase todos eles fazem referência à vida das plantas, dos animais silvestres e dos indivíduos, como elementos integrantes do meio ambiente. Entre as escrituras sagradas podem ser citados os Vedas, a Bíblia e o Corão. Diversos são os textos escritos. Muitos deles, há quase 2.500 anos atrás e já mencionavam uma preocupação acentuada com a conservação da natureza

Além dos princípios de religiosidade, os homens considerados santos, na época, veneravam o ar, a água, a terra (como fonte de vida e alimento) e o fogo (energia). Todos estes, eram considerados como partes integrantes do Cosmos, e sem eles não teria condição de vida. Essa religiosidade procurava demonstrar a inter-relação de todos os seres vivos e dos elementos abióticos que os cercam. Isso se identifica na disciplina que hoje é estudada nas escolas e universidades sob o nome de Ecologia.

Para as religiões de matriz africana os deuses são representados através dos vários elementos da natureza. Segundo mãe Santinha, cada indivíduo possui um Orixá que interfere no curso de sua vida. Sendo assim, cada indivíduo não poderá utilizar qualquer folha sem antes pedir permissão aos Orixás por meio do jogo dos búzios. Além das ervas, como elementos terapêuticos, o Candomblé utiliza outros elementos da natureza destinados à cura.

Sentadas defronte para a mata que cerca o Terreiro Ilê Axé Oiá sentimos a suavidade do ar puro que a Salvador não conhece. Parecíamos estar muito distante do ar empoeirado causado pela queima dos combustíveis de automóveis. O Terreiro fica situado em uma das periferias do Parque São Bartolomeu. Mata verde e pouco freqüentada pelos soteropolitanos. Este é um dos poucos lugares verde que a cidade de Salvador abriga. A sua extensão é acompanhada pelo rio Cobre.

Para mãe Santinha a exploração predatória feita pelo homem, ao provocar desflorestamento, poluição da água, do solo do ar e ao dizimar populações animais, leva a extinção de muitas espécies inclusive das plantas, muitas das quais, servem de matéria prima para cura de diversas doenças. Segundo ela muitas espécies de plantas, sequer foram descobertas. “Estamos destruindo um tesouro que nem sequer conhecemos”. Termina a valorixá.

O culto aos Orixás requer percepção e purificação interior do corpo. Esse asseio é realizado por meio de banhos de folhas e com pedidos de redenção aos orixás. Segundo a farmacêutica e doutora, Mara Zélia, o primitivo dependia fundamentalmente da natureza para sobreviver. Contudo, o saber sobre a utilidade de determinadas plantas foi se perdendo no decorrer das civilizações. Na contemporaneidade o conhecimento das ervas é dos índios, africanos, yalorixás, babalorixás e estudiosos do assunto.

Na perspectiva que trilha os ensinamentos do Candomblé poderíamos ter no amanhã uma sociedade muito mais humanizada e de bem com a natureza. “Aqui no Ilê temos uma horta comunitária, destinada para o bairro de Conjunto Pirajá. Nessa horta plantamos e cultivamos somente plantas medicinais. Há variedades de plantas. A comunidade, sendo uma parcela evangélica, católica e de candomblé vem buscar as folhas quando necessário e sem nenhuma discriminação no que se refere ao candomblé”, declarou mãe Santinha.

Para o candomblé todas as plantas são sagradas. Os seus frutos e as suas sementes, cada uma com as suas propriedades, oferecem ao homem e a mulher nutrientes necessários à vida. “A medicina utiliza a extração das ervas para a produção de remédios e nós, de candomblé, as utilizamos como forma de colhermos a sabedoria destinada a nossa proteção física e espiritual”, complementou mãe Santinha.

No processo de amadurecimento e evolução das idéias e de comportamento, que dizem respeito à natureza, surge a Declaração sobre o Ambiente Humano que foi estabelecida na Conferência de Estocolmo em 1972. Cujas prerrogativas tinham o objetivo de servir de inspiração e orientação à humanidade para a preservação e melhoria do meio ambiente. 20 anos depois, houve a Conferência do Rio de Janeiro, a Rio 92, e mais recentemente pela de Joanesburgo na África do Sul, a Rio +10.


Atualmente o chamado desenvolvimento sustentável é o único capaz de propiciar condições de preservar os recursos naturais e condições de vida saudável para as gerações futuras. Para que isto ocorra, a educação ambiental tem uma importância extraordinária porque conscientiza e altera os padrões de comportamento do ser humano em relação à natureza.

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